O 1º Acampamento
Brownsea 25 de Julho de 1907
Num pequeno cais esperava o barco que fazia a travessia entre o porto de Poole e a ilha de Brownsea. Era o dia 29 de Julho de 1907 e o calor, sufocante, fazia brilhar enormes gotas de suor na testa de 2 adultos, Baden Powell e Kenneth Maclaren, e 22 rapazes que se apinhavam no pequeno convés da embarcação.
Baden Powell acedera ao convite dos seus amigos Mr e Mrs Charles Van Raalte com quem passava férias em Maio na Irlanda para visitar o seu castelo na Ilha de Brownsea que aliás conhecia bem porque já lá tinha aportado varias vezes com o seu irmão na sua canoa apesar de ser uma ilha privada. Que melhor local poderia ter pensou logo.
Ao longe começaram a surgir os primeiros contornos da ilha. Assim que atracaram, os olhares de todos fixaram-se na exuberante flora que os circundava fazendo-os sentir que tinham chegado a um local único e maravilhoso onde iriam viver a aventura de uma vida.
Enquanto percorriam os cerca de 800m que os distanciava do centro da ilha, onde iriam montar campo, um dos adultos olhava aquele estranho grupo de rapazes oriundos, na sua maioria, dos extratos sociais mais baixos da sua amada Inglaterra e que queria ajudá-los a encarar a vida orientados por ferramentas valores e princípios que quase todos desconheciam. Sentia, no entanto, que a tarefa não iria ser fácil, pois apesar do entusiasmo que reinava no grupo, sobressaiam a insegurança de uns, a reserva de outros e as dificuldades de relacionamento de todos eles, bem visíveis no distanciamento a que se entregavam desde que se encontraram pela primeira vez e enquanto percorriam os metros finais. Para conseguir atingir os seus objetivos teria de colocar em campo toda a sua famosa capacidade de comunicação e de agregação de vontades desenvolvida nos últimos anos aquando da sua passagem pelo exército inglês.
Sabia o que queria e, nas dificuldades que observava, definiriam o cerne da sua estratégia: pequenos grupos de rapazes, juntos numa mesma equipa a que chamaria patrulha, sem distinção de cor ou credo, iriam aprender e trabalhar a liderança, a responsabilidade e o espírito de comunidade, desenvolvendo os seus pontos fortes e combatendo os pontos fracos, iriam perceber que a força da patrulha, estava precisamente no que os diferenciava. Cada um deles era especial, era único com capacidades e saberes diferentes que se iriam complementar e contribuir para o sucesso final da patrulha.
Para levar a cabo aquele empreendimento idealizara um conjunto de desafios que o grupo teria de superar e em que, cada patrulha e cada um, teria o seu papel a desempenhar. Pretendia assim proporcionar-lhes um espaço em que, cada falha, cada tarefa não cumprida, representasse uma oportunidade de aprendizagem e de crescimento pessoal e em comunidade.
Através do jogo, executando, avaliando, se necessário deixando falhar para corrigir e voltar ao princípio, mas também celebrando os sucessos, esperava-se contribuir não só para ajudar aqueles jovens a integrarem uma sociedade com ferramentas para a vida, mas também marcar no seu carácter a disciplina, o autoconhecimento, e o respeito por si, pelos outros e pela natureza.
Esperava-se assim, que no fim deste acampamento de duas semanas numa ilha longe do bulício das cidades, esta experiência levasse a que no futuro aqueles 22 jovens oriundos de diferentes classes sociais, pudessem ser melhores cidadãos, mais conscientes do mundo que os rodeava e com valores a nortear a sua vida.
Hoje vivemos num mundo seguramente diferente, num cenário político e social bastante diverso mas continuamos a encontrar pontos de convergência em que precisamos de estar atentos a questões como a violência expressa nas mais variadas formas, o desrespeito pelos valores humanos, a fome, a falta de consciência para os problemas crescentes da nossa pegada ecológica…
Façamos em cada dia uma Ilha de Brownsea que nos ajude a ter estes valores sempre presentes na nossa missão de formadores.